sábado, 19 de julho de 2025

Quando a extrema direita fere a si mesma

O anúncio de Donald Trump de aplicar tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros caiu como bomba. Tentou “agradar” o clã bolsonarista, mas acabou revelando algo mais profundo: a política externa dos EUA pode ser movida por caprichos e interesses ideológicos, sem medir as consequências. E quem paga a conta, claro, é o Brasil – em especial os setores econômicos que mais apoiaram o ex-presidente.

A medida, com data marcada para 1º de agosto, foi vista por muitos como uma jogada para pressionar o Judiciário brasileiro e blindar Bolsonaro. O efeito, no entanto, foi o oposto: enfraqueceu o bolsonarismo e empurrou Lula para o centro do tabuleiro, como líder sereno e preparado diante da crise. Mas que ninguém se engane: essa “vitória” carrega uma bomba-relógio econômica com potencial devastador.

A indústria brasileira pediu ao governo uma trégua: 90 dias de prorrogação, como noticiado pelo Diário. Alckmin, comedido, entrou em campo e lembrou que os EUA têm superávit comercial com o Brasil há 15 anos. A resposta de Trump foi clara e absurda: faz porque pode. Um ato de força, sem qualquer base racional – mas com alto poder destrutivo.

O mais irônico? As tarifas atingem em cheio o agronegócio – base fiel de Bolsonaro. Exportadores de carne, grãos e industrializados foram jogados no fogo cruzado de uma disputa que nada tem a ver com seus interesses. Bolsonaro, que sempre posou de defensor do setor, agora aparece como cúmplice de uma medida que ameaça empregos e contratos.

Lula, por sua vez, reagiu com maturidade, buscando articulação internacional e agindo como estadista. Ganhou pontos com o centro político, com o empresariado e reforçou a imagem de liderança responsável. No curto prazo, ponto para ele. O futuro, porém, pode cobrar caro.

Se os mercados se fecharem, os dólares somem. O câmbio dispara. A inflação sobe. O custo da comida pesa no bolso de quem já tem pouco. A instabilidade produtiva vira caos. E o desgaste político bate à porta. Se o governo demorar a reagir, o que era vantagem pode virar veneno.

A hora é de estratégia. Lula precisa aproveitar a crise para ampliar mercados, fortalecer laços com China, Europa e vizinhos latinos, proteger setores frágeis e apostar no mercado interno. E, acima de tudo, sustentar uma narrativa clara: o Brasil é soberano e não se curva a ameaças. Mas sem cair na tentação de alimentar o conflito – que só interessa aos que lucram com o caos.

Ganhar a disputa de hoje é importante, mas o povo julga é na hora da compra do arroz, do gás e do feijão. A inflação é cruel e silenciosa. E o brasileiro sabe muito bem quem estava no comando quando ela voltou ao prato.

É hora de ação, inteligência e coragem. Porque política, no fim, é isso: saber ler o tempo – e decidir de que lado da história se quer estar.

Leonardo J. D. Campos

Artigo publicado no Jornal Diário do Grande ABC (impresso e digital) 
- 17 de julho de 2025 - Pág. 2
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